Na semana em que a importância do SUS foi exaltada, e virou pauta nacional, em virtude do transplante de coração que garantiu a melhora do quadro clínico muito delicado em que se encontrava o Faustão, em Poços o SUS também foi pauta. Infelizmente, com um prognóstico muito pior que o do nosso querido Comunicador.
As revelações da CPI da Saúde, feitas no dia 28/08/2023 na Câmara Municipal de Vereadores de Poços de Caldas trouxeram à tona, o que qualquer usuário da rede municipal de saúde já sabe, e sente na pele: estamos abandonados, e ninguém liga pra nós. O relatório técnico da empresa Grant Thornton apontou uma quantidade infindável de irregularidades, como por exemplo: médicos que faziam escalas humanamente impossíveis de serem cumpridas, ultrapassando cem horas de plantão, profissionais que não tinham inscrição ativa no CRM realizando atendimentos, documentos solicitados para análise, que não foram encaminhados para a Câmara Municipal, aditivos contratuais feitos à margem legal, empresas que receberam valores sem a fiscalização sobre o serviço que foi prestado, e por aí vai.
Por si sós, todas as questões apontadas no relatório são gravíssimas, e devem ser alvo de uma força tarefa, com objetivo de buscar a responsabilização de todas as partes envolvidas na gestão desses contratos. Porém, causou extrema indignação a fala do vereador Silvio de Assis, que presidiu os trabalhos da CPI, ao longo desses meses. Ele afirmou que muitos pacientes podem ter morrido, por conta de altas indevidas, já que o sistema não tinha condições de absorver a demanda. “O paciente recebeu alta cedo, e à tarde estava morrendo em casa”.[1]
Se essa fala não lhe causa espanto nem choque, talvez o leitor que acredita ser isso normal, já esteja morto por dentro. Passamos por uma pandemia, é verdade. Tivemos diversas dificuldades que foram em grande parte causadas pela COVID-19. Mas convenhamos, a situação crítica da saúde em Poços não vem de agora. A própria Secretaria de Saúde reconhece isso, quando lança “O maior programa de Saúde Pública em Poços de Caldas”, para zerar uma fila de aproximadamente 50 mil procedimentos, que nunca deveria ter existido. A prefeitura confessa, que alguns procedimentos já estavam aguardando na fila há mais de cinco anos[2].
Calma, que tem mais. A Secretaria de Saúde, pra dizer que estava lançando um programa que ia zerar a fila de procedimentos (ao menos os que estavam represados até 2022), até o mês de abril de 2023, tinha gastado o total de R$ 184.961,03.Você não leu errado. Cento e oitenta e cinco mil reais em marketing. Esse recurso polpudo, poderia ter sido transformado em 690 ressonâncias magnéticas, ou então 1480 polissonografias, ou então 4111 mamografias[3]. Me parece o mesmo que queimar dinheiro. Dizer que está zerando a fila e passar essa sensação, para que as pessoas realmente comecem a acreditar nisso. No inglês, usamos a expressão “fake it till you make it”.
A gestão da saúde em Poços tem essa energia: finja até você conseguir.
Bater um sininho como indicativo de que se atingiu uma “meta”, me parece apenas contabilizar aquele sofrimento, que tem personalidade, pertence à Dona Ana, ao Seu José, a Tianinha, ao Francisco, como sendo um número, em uma planilha do excel. No fim, quem aguarda em uma fila, sabe exatamente o peso dos minutos, das horas dos dias. Sabe o que é peregrinar, de sala em sala, de PSF em PSF, para receber informações desencontradas, e não ter o seu problema resolvido. Eu poderia passar mais tempo tratando das soluções para esses problemas, que se colocadas em prática gerariam economia, racionalização e rapidez na gestão da saúde em nível municipal. No entanto, só a gente sabe onde o calo aperta, como diz a minha mãe. Se quem faz a gestão do SUS em Poços de Caldas não usa e nem depende desse sistema, como entenderá as necessidades dos usuários?
[1] https://www.youtube.com/live/igCxt-UYXoU?si=sBSLWN392SmKj_tA
[2]https://pocosdecaldas.mg.gov.br/noticias/prefeitura-lanca-programa-saude-fila-zero-de-saude-para-zerar-filas-de-espera-de-consultas-exames-e-cirurgias-nesta-quarta-15/
[3] consultar os anexos – valores individualizados por procedimentos https://pocosdecaldas.siscam.com.br/Documentos/Documento/221476