Tiago Mafra: Poços de Caldas não paga o piso do magistério

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O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) é um fundo especial com intuito de garantir o custeio e financiamento da educação básica. Municípios investem na Educação Infantil e Ensino Fundamental, enquanto estados devem atender o Ensino Fundamental e prioritariamente o Ensino Médio. Os valores são calculados a partir do número de alunos extraído do censo escolar do ano anterior  de cada rede de ensino. Esse número é multiplicado pelo valor mínimo por estudante definido anualmente por uma Portaria Interministerial do Ministério da Educação e do Ministério da Fazenda.

O FUNDEB foi transformado em fundo permanente em agosto de 2020, tornando-se assim, uma política de Estado, além de prever o aumento gradativo dos percentuais que devem ser investidos na educação.

Garantida a política ininterrupta e o crescimento de valores nos próximos anos, é primordial que os recursos sejam aplicados pelos Estados e Municípios para atender os objetivos do fundo: manutenção (estrutural), desenvolvimento (programas) e valorização profissional (pagamento de servidores). O novo fundo aprovado em 2020 estabelece que 70% dos recursos, no mínimo, devem ser aplicados em remuneração dos profissionais da educação em exercício, sendo o restante, passível de aplicação das demais ações da educação.

Em consulta ao site do Tesouro Nacional (05/01/23), Poços de Caldas consta como tendo recebido em 2022, pouco mais de 130 milhões de reais do fundo. Mesmo assim, uma parcela significativa do magistério encontra-se recebendo salário base abaixo do Piso Nacional do Magistério.

O Piso Salarial Profissional Nacional para os profissionais do magistério público da educação básica foi instituído em 2008, com vistas a melhorar a qualidade da educação e valorizar os profissionais, regrando carga horária com e sem alunos, além de instituir valores mínimos de rendimentos. A lei fala em vencimentos mínimos para “até 40 horas semanais de trabalho”. O valor atual é de R$ 3.845,63 (2022).

Em Poços, apesar da lei, sindicato e prefeitura entendem que, como a carga horária base da tabela de vencimento dos professores é de 20 horas, o valor do piso deve ser calculado proporcionalmente, ou seja, o piso seria de R$ 1.922,81. Atualmente o salário base para professor PI no município é de R$ 1.538,16. Assim sendo, de qualquer forma e interpretação, o município paga hoje seus professores abaixo do piso nacional. Com exceção dos servidores com maior tempo de serviço, que já tem acrescido em seus rendimentos promoções e ganhos de carreira, o professor encontra-se com salário defasado abaixo do que preconiza a lei federal.

Surgiu inclusive, ao longo das negociações em 2022, a proposta de complementação para aqueles que estivessem abaixo dos valores obrigatórios. Porém, essa é uma dinâmica que ataca o problema emergencial, mas achata salários e faz com que os servidores com mais tempo de serviço, tenham suas carreiras desconsideradas, desestimulando o trabalho no serviço público e tendo como resultado desvalorização e perda salarial, o contrário do que o FUNDEB e a lei do Piso buscam.

MUNICÍPIO DE POÇOS DE CALDAS-MG

Valores de repasse do FUNDEB, Piso Nacional, proporcionalidade, vencimentos base do professor no município e reajustes anuais.
Ano Repasse anual do FUNDEB: Valor Consolidado Valor Piso Nacional 40 hs Valor Piso Nacional  20 h (Proporção) Vencimento Base Professor PI 20h Reajuste Servidor
2016 R$ 67.173.944,00 R$ 2.135,64 R$ 1.067,82 1.089,16 10,67%
2017 R$ 67.797.866,43 R$ 2.298,80 R$ 1.149,40 1.189,36 9,20%
2018 R$ 50.980.641,19 R$ 2.455,35 R$ 1.227,48 1.230,99 3,50%
2019 R$ 78.471.458,33 R$ 2.557,74 R$ 1.278,87 1.280,23 4,00%
2020 R$ 88.212.492,95 R$ 2.886,15 R$ 1.443,08 1.280,23 0,00%
2021 R$ 116.756.357,60 R$ 2.886,15 R$ 1.443,08 1.348,08 5,30%
2022 R$ 130.292.354,64 R$ 3.845,63 R$ 1.922,81 1.538,16 14,10%
FONTE: Tesouro Nacional, Prefeitura de Poços de Caldas, CNTE.

Alguns apontamentos são necessários:

  1. De 2016 a 2022, o FUNDEB repassado a Poços de Caldas teve um acréscimo de 63 milhões de reais, ou seja, um aumento de 94% em valores totais;
  2. No mesmo período, o Piso Nacional teve acréscimo de cerca de 80% em seu valor, enquanto o salário base do PI em Poços de Caldas teve acréscimo de pouco mais de 41%;
  3. Mesmo com o cumprimento do 1/3 fora de sala de aula, que aumentou a demanda por professores, o município continua fora do cumprimento da lei, pois se por um lado garante a carga horária sem alunos, por outro tem sistematicamente ficado abaixo dos valores previstos em lei;
  4. Se considerado o valor total do Piso Nacional, Poços de Caldas nunca cumpriu a lei integralmente. Se considerada a proporcionalidade para 20 horas, o município não cumpre a lei desde 2020.
Dados para Poços de Caldas-MG

Para alcançar o valor do piso nacional do magistério, a Prefeitura de Poços precisaria hoje, de um reajuste de 150%, se considerado seu valor integral. Se acatada a proporcionalidade para 20h, o reajuste necessário é de pouco mais de 25%. Isso se considerados os valores até 2022. A previsão do piso para 2023 é de R$ 4.420,36, exigindo correções de 187% (para 40h) ou 43% (para 20h).

Por fim, para evitar arranjos emergenciais e soluções que geram outros problemas, como o caso das complementações e achatamentos salariais, é importante que haja estudos e ações no sentido de corrigir as distorções legais e salariais a partir da base das tabelas de vencimentos do magistério, garantindo melhor qualidade de serviços, salários adequados, resguardo dos ganhos ao longo da carreira e adequação às leis nacionais e recursos recebidos. Do contrário, a valorização da educação de modo geral e dos professores de modo específico, não passará de discurso na boca do senso comum e dos políticos e técnicos em épocas eleitorais. Quanto mais tempo de inércia, maior a dificuldade de retificação.

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Tiago Mafra é professor de Geografia da rede pública municipal de ensino e no pré-vestibular comunitário Educafro desde 2009. Brigadista de Solidariedade a Cuba (2011), Especialista em Filosofia (2011) e em Políticas Públicas para Igualdade (2018), Mestre em Educação (2019). Secretário Geral do PT de Poços de Caldas.
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